19 de agosto de 2009

Existe uma diferença entre decoração e tratamento acústico?


A partir de hoje, Rui Nakano, experiente tecnico de manutenção de estudios e equipamentos eletrônicos, começa como colaborador do Profisom, com uma excelente materia sobre Acustica!!!
obrigado Mestre Rui Nakano, a comunidade de audio do Brasil te agradece!!!

Exite uma diferença entre decoração e tratamento acustico?
Por Rui Nakano

Hoje existe uma proliferação de projetos de acústica. Mas eles são projetos ou é tudo apenas decoração? Existe diferença entre contratar um projetista ou um decorador, ou um marceneiro? Vamos voltar no tempo para saber como esta área se desenvolveu.

Há quarenta anos atrás (estamos falando da década de 70) nem mesmo os "gringos" sabiam muito sobre acústica aplicada a estúdios de gravação.
Todo estúdio era feito de maneira empírica. Como podem ver esta é uma das maneiras para se projetar estúdios não só no Brasil, mas no mundo todo.

Em 1977 a KEF, a UREI, a JBL, entre outros, passaram a fabricar caixas acústica Time Aligned que significa com alinhamento de tempo ou alinhamento em fase. Ao invés de fabricar caixas com alto-falantes parafusados na caixa, passou a se fabricar caixas cujos componentes estivessem alinhados com o ouvinte e portanto que gerasse o som ao mesmo tempo. (isso significa em fase)

Em 1979 Davis publicou um trabalho a respeito de ITGD (initial time-gap delay). A partir de 1980 foram publicados e construídos alguns estúdios com controle deste fator, que foram chamados de LEDE (live-end-dead-end).

Tudo isso é bom no laboratório ou na prancheta de desenho. Mas como é possível medir os resultados? Desde a década de 60 existem trabalhos a respeito de FFT (Fast Fourier Transform) e os cientistas passaram a procurar maneiras de torná-lo aplicável ao mundo real.

No final da década de 70 foram lançados os analisadores de espectro em tempo real (Real Time Spectrum analyser) que gerava em forma de gráfico a resposta de freqüência pontual do local medido. Esta é uma das ferramentas que foi muito usado para tentar se obter salas calibradas. Causou a produção em massa de equalizadores gráficos e muitos acreditaram que isso resolveria todos os problemas acústicos. Com as experiências ficou claro que problemas acústicos precisam soluções acústicas e o equalizador era apenas um paliativo.

Com o advento dos equipamentos para medição TEF (Time/energy/frequency) tornou-se possível visualizar o resultado das reflexões. Tornou os gráficos mais complicados, com três dimensões e menos compreensíveis para um leigo.

Caixas acústicas com coerência de fase entre seus componentes e equipamentos de medição a preço acessível transformou a acústica de empirismo para uma ciência.

Apesar disso no Brasil tratamento acústico continua a ser algo feito aleatoriamente. Existe até ensino de acústica na faculdade, mas a especialização em estúdios de gravação é tão reduzido quanto o número de estúdios.

A acústica aplicada em estúdios de gravação tem parte de tecnologia empregada na construção de teatros, parte de tecnologia usada na construção de instrumentos musicais, tem os resultados práticos para obter os sons que hoje são usados na musica pop, tem a interferência da psicoacústica, e da interação entre o ser humano e o ambiente, a tecnologia aplicada em amplificadores de áudio e caixas acústicas. E no final, mas que costuma sempre ser colocado como o inicio, o acabamento e as cores finais que vão interferir com o local de trabalho, aonde pessoas passarão muitas horas. Alem disso tudo ainda tem a iluminação, o fornecimento de energia elétrica, condicionamento de ar, controle de ruídos e refrigeração de equipamentos. (assuntos relacionados ao estúdio mas que fogem completamente a área acústica).

Tive oportunidade de testar a diferença entre tratamento feito com objetivo e sem objetivo, com um cliente que não acreditava nos meus argumentos (depois de conhecer um vendedor, temos a tendência a acreditar que todos vendem as mesmas coisas)!

Ele possuía duas salas que foram transferidas de uma casa para outra, com uma grande limitação de verba. Portanto uma sala foi modificada e a outra foi copiada da sala existente anteriormente. A que foi modificada sofreu alteração principalmente na disposição dos painéis acústicos (troquei de lugar, sem fazer outros) visando o controle das reflexões iniciais em relação à posição das caixas acústicas, e no acréscimo de um bass trap sintonizado na segunda freqüência modal (a primeira produziria um aparelho acústico grande demais para caber na sala).

Existe uma nítida diferença entre os resultados. A primeira ficou parecida com qualquer sala a qual foi adicionado algum controle de absorção de alta freqüência. A segunda apresenta uma imagem estéreo muito melhor e a baixa freqüência mais controlada que a primeira. Então as mixagens efetuadas nesta sala ficam mais parecidas com aquilo que se deseja obter nos meios de transmissão (radio e televisão) fazendo com que fique mais "leve" e "mais fácil" de se trabalhar. Enquanto a outra continua a não ter precisão nas imagens acusticamente geradas. Quem já passou por uma sala acusticamente ruim e depois foi trabalhar em uma boa sala acusticamente falando, sabe o que estou dizendo.

Portanto realmente existe uma diferença entre decoração e acústica.
E quem sabe o que se deve fazer? Em uma sala tratada acusticamente, compare resultados auditivos e não visuais. O que é mais fácil falar do que fazer, pois a maioria das pessoas conforme a programação neurolinguística é visual e não auditiva. Mas isso é assunto para um outro artigo.

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